domingo, 25 de outubro de 2015

O CONSELHO DO FUNDEB NO MUNICÍPIO DE ITABORAÍ E A DEMOCRACIA DA TERCEIRA VIA: UMA ANÁLISE CRÍTICA

Dissertação de Mestrado de Marco Vinícius Moreira Lamarão (UFRJ - 2013)



Disponível também em: http://www.educacao.ufrj.br/dmarcolamarao.pdf

Uma imagem vale mais que mil palavras: a imagem de São João Batista de Itaborahy

Deivid Antunes da Silva

INEPAC

      Quem chega a Praça principal de Itaboraí se depara com um imponente prédio colonial: a Igreja Matriz de São João Batista [1]. Neste prédio, o devoto ou visitante que entra pela grande porta principal [2] recinto a dentro vê um conjunto retabilístico [3] muito importante. À esquerda, da nave da Matriz estão os retábulos de 2º tipologia do “estilo nacional” português do período barroco [4]. Já os do lado da epístola, isto é, da direita da nave são da 4º tipologia ou “novo estilo” (Estilo rococó) [5].
      No altar-mor está a imagem [6] do patrono da Igreja Matriz, São João Batista [7] em tamanho natural com uma grande riqueza de detalhes, pois o artista conseguiu expressar na madeira até veias humanas. Infelizmente por carência de fontes a autoria da imagem do patrono da Matriz de Itaboraí é desconhecida, porém por suas característica é possível perceber que foi esculpida no século XVIII e não se trata de manufatura nacional como observou Nancy Rabelo (2009) [8] . Além da rica policromia [9] a imagem de São João Batista era ornada com uma cruz proporcional ao conjunto artístico e uma auréola [10], ambos em prata dourada, que infelizmente levadas nos furtos de 1970 [11] e de 1984 [12].
      Ao observar a imagem [13], o espectador de hoje pode vislumbrar como um fiel do século XVIII via a imagem no sentido pedagógico da religião. Como a Igreja Católica, no cotidiano da prática da Fé poderia ensinar as massas se as mesmas eram absolutamente analfabetas? Para os seletos que tinham um pouco de letramento o acesso a uma bíblia na sua língua materna ainda era proibido e a interpretação dos textos sagrados cabia exclusivamente ao clero. Além disso, as missas eram no Rito Tridentino, ou seja, em latim.
     Diante disso, a Igreja Católica se valeu de uma tática usada por vários povos da antiguidade, sobretudo o Império Romano do qual herdou muitas características: trata-se do uso de imagens para representação de seus santos [14]. Em suma, diante da conjuntura do período, o interior das igrejas deveria representar a glória dos Céus e nada mais propício do que o uso de imagens para esse fim, sobretudo no barroco, onde a tipologia da Igreja Matriz de Itaboraí esta inserida.
    Essa imagem de São João Batista tem em seu conjunto a representação de um cordeiro que no judaísmo antigo era sacrificado para a purificação do fiel em ritual oferecido no Templo de Salomão em Jerusalém [15]. Na mão direita da imagem se vê uma bíblia que representa a doutrina pregada por João Batista. Na esquerda uma cruz proporcional à imagem. Nas demais representações do Santo há uma flâmula pendurada com uma inscrição em latim: “ECCE AGNUS DEI” que significa: “Eis o Cordeiro de Deus.” Esta frase é uma referência a fala de João Batista [16] em anunciar a vida de Jesus de Nazaré como o salvador do mundo, através do sacrifício do próprio Jesus que segundo a Tradição Cristã se imolou como cordeiro para purificação dos pecados de toda a humanidade.
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Deivid Antunes da Silva é Historiador e Professor de História na Rede Estadual de Tanguá.
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Fontes e Bibliografia:
[1] Sobre a Igreja Matriz de São João Batista ver o texto “A Construção da Igreja de São João Batista de Itaboraí” escrito pelo professor Me. Gilciano Menezes Costa disponível em: https://www.facebook.com/permalink.php… 5 067306&substory_index=0
[2] Atualmente a porta principal esta fechada por risco de acidentes.
[3] É uma peça de altar de madeira, mármore ou de outro material, com lavores, que fica por trás ou acima do altar e que, normalmente, encerra um ou mais painéis pintados ou em relevo.
[4] É o nome dado ao estilo artístico que floresceu entre o final do século XVI e meados do século XVIII, inicialmente na Itália, difundindo-se em seguida pelos países católicos da Europa e da América.
[5] Ver RIBEIRO, Luiz Marcello Gomes. Gritos e sussurros: a retabilística barroca de São João de Itaboraí. 1º Ed. – Rio de Janeiro: Ed. do autor, 2012, Capítulo IV.
[6] A imagem foi retirada do Altar-mor junto com as outras da Igreja devido ao trabalho de descupinização emergencial na década de 2010.
[7] Dentro dos Textos Sagrados e pela tradição Cristã, João era filho de Zacarias e Isabel, prima de Maria a mãe de Jesus de Nazaré. Foi um profeta e primo de Jesus. Morreu martirizado por decapitação. Recebeu o apelido de batista por batizar os fies com água para livra-los do pecado original.
[8] “ A ótima definição anatômica, as proporções exatas e domínio técnico desta escultura, demonstram ter sido executada por artista de formação exemplar. Detalhes como pés e mão, entre outros, demonstram estes dotes artísticos, situando com precisão ossos, veias, e músculos. O refinado acabamento ornamental demonstra o alto nível da encomenda, que contudo não possui olhos de vidro” IN: RABELO, N. R. M. A escultura religiosa fluminense e as Visitas Pastorais do Cônego Pizarro em 1794-1795. Tese de Doutorado apresentada a escola de Belas Artes da UFRJ. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009, citado por RIBEIRO, Luiz Marcello Gomes. Gritos e sussurros: a retabilística barroca de São João de Itaboraí. 1º Ed. – Rio de Janeiro: Ed. do autor, 2012, p. 130.
[9] Policromia é a arte feita com várias cores. É o emprego de várias cores no mesmo trabalho.
[10] Anel luminoso ou peça ger. de metal, circular ou semilunar, com que pintores e escultores freq. circundam a cabeça das personagens sagradas; nimbo, resplendor.
[11] FABRINO, Raphael João Hallack. Os furtos de Obras de Arte Sacra em Igrejas Tombadas do Rio de Janeiro (1957-1995). Dissertação de mestrado – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2012, p. 50.
[12] “O último furto ocorrido em 1984 se refere ao segundo furto na Matriz de São João Batista em Itaboraí. De acordo com as informações da reportagem foram levados da igreja cerca de Cr$ 20 milhões em objetos sacros de prata. Os seguintes objetos foram furtados: uma 42 coroa de São João Batista, uma chave de sacrário, duas âmbulas, duas tecas (cofres pequenos), uma coroa paroquial, uma coroa de Nossa Senhora de Fátima, um punhal de Nossa Senhora das Dores e um resplendor de Santo Antônio.” IN: FABRINO, Raphael João Hallack. Os furtos de Obras de Arte Sacra em Igrejas Tombadas do Rio de Janeiro (1957-1995). Dissertação de mestrado – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2012, p.41-42.
[13] Foto de Flavio Santos. Inventário de Arte Sacra Fluminense. Disponível em: http://www.artesacrafluminense.rj.gov.br/modules.php…#
[14] Sobre imagens sacras ver o Código de Direito Canônico Título IV, câns. 1187-1189. 42.
[15] Ver o texto o “Cordeiro de Deus”. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Cordeiro_de_Deus
[16] Bíblia de Jerusalém. 1ª Ed. – 9ª reimpressão. São Paulo: Paulus, 2013 IN: Evangelho de João, cap. 1 , vers. 29. p. 1844.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Frei Vicente Bogard: “Lepra”, superação e altruísmo

Luiz Maurício de Abreu Arruda
Projeto Quissamã Memória Viva e Acervo Heitor Costa
      A prática de nomear logradouros quase sempre é identificada como distorção da legislatura municipal, porém, um olhar mais atento é capaz de evidenciar como esse processo é capaz de reproduzir a memória de personagens e fatos da história nacional e local. No entanto, é importante destacar que o tempo é capaz de diluir o significado das homenagens e torná-las pouco mais do que uma placa de rua.[1]
      Ainda que esse exercício demonstre a clara expressão de uma história positivista, que tem como grande pilar, privilegiar os grandes fatos e personagens, verificamos em algumas dessas “homenagens” a possibilidade de revisitar histórias de vida que realmente encantam devido a sua abnegação e dedicação ao semelhante. Nesse artigo trataremos de um sacerdote da Ordem Terceira Franciscana Secular , frei Vicente Bogard.[2]
      Frei Vicente foi capelão durante longo período na antiga Colônia Tavares de Macedo. Após ser diagnosticado com “lepra” (hanseníase), durante um período em que a principal política profilática do Estado era a internação compulsória, buscou tratamento na antiga Colônia e lá permaneceu mesmo depois de ser curado.[3]
      É interessante destacar a atuação constante desse religioso, pois sua vida está na confluência de dois municípios, Itaboraí e Quissamã. A primeira fotografia (esquerda) registra Frei Vicente ainda muito jovem junto de seus coroinhas em frente à Gruta Nossa Senhora de Lourdes em Quissamã [4], onde atuava como sacerdote. Na segunda fotografia (direita) trata-se do frei com aproximadamente 60 anos.[5]
      Caracterizado por uma pessoa de hábitos extremamente simples, frei Vicente era admirado por aqueles que o conheciam, devido principalmente a sua dedicação aos doentes e ao zelo e compromisso religioso. Em Itaboraí, sua atuação por aqueles que padeciam internados na Colônia Tavares de Macedo é algo presente na memória dos antigos ex-internos, que conviveram com o religioso. Aonde chegava já era rodeado por crianças que alegres o cercavam para ganhar doces e balas.[6]
      Participava ativamente junto à comunidade católica local e de outros municípios, buscando arrecadar fundos e donativos para aliviar o sofrimento dos doentes e de seus familiares. Através do elemento religioso, contribuiu na dissolução do forte estigma existente junto aos doentes, pois através das festas religiosas os “sãos”, movidos pela fé pelo sentimento de caridade, buscavam a Colônia através das atividades religiosas.
      Outra importante ação na Colônia Tavares de Macedo ocorreu no final da década de 1950, quando Frei Vicente liderou a campanha pela construção da Capela Nossa Senhora Aparecida, para facilitar o deslocamento dos doentes.[7] A construção ocorreu em um dos antigos pavilhões de internamento. [8] Essa campanha foi exaustiva, atraindo membros da comunidade católica, além da adesão de outros atores que buscaram sensibilizar a sociedade local da necessidade do novo templo para os doentes.
      Trabalhou até os últimos momentos de sua vida, quando já em idade avançada morreu tragicamente após descer do coletivo em Venda das Pedras, quando buscava atravessar a rodovia.[9]

Fontes e Bibliografia:

[1] DIAS, Reginaldo Benedito. A História além das placas: os nomes de ruas de Maringá (PR) e a memória histórica. In: Revista de História e Ensino, Londrina, v. 6, p. 103-120, out. 2000.
[2] Devido à presença marcante da Ordem Franciscana em Itaboraí, sugerimos a leitura de dois textos deste Projeto: COSTA, Gilciano Menezes. As relações escravistas no Convento de São Boaventura. Revista Tessituras, Nº6, Maio de 2015, p. 82-101. Disponível em: http://historiadeitaborai.blogspot.com.br/…/artigo-publicad… e http://www.revistatessituras.com.br/arquivo/5.pdf . Ver também: COSTA, Gilciano Menezes. O Convento de São Boaventura (1925). História de Itaboraí: Pesquisa, Memória e Educação. 2015. Disponível em: https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=432016303637154&id=351048125067306&substory_index=0.
[3] É importante destacar que após o final da Segunda Guerra Mundial, graças aos avanços da indústria químico-farmacêutica e das pesquisas laboratoriais, o uso das sulfas como principal terapia aos hansenianos começou a produzir resultados satisfatórios e com isso aumentou consideravelmente o número de altas. ARRUDA, Luiz Maurício de Abreu. “A nova Jericó maldita”. Um estudo sobre a Colônia de Iguá em Itaboraí/RJ (1935-1953). Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.
[4] A Gruta Nossa Senhora de Lourdes foi construída em 1928.
[5] A fotografia da esquerda é datada de 1931 e foi gentilmente cedida pelo Projeto Quissamã Memória Viva. Agradeço pelas informações fornecidas por Helianna Barcellos de Oliveira, que muito nos auxiliou sobre a atuação do Frei Vicente em Quissamã. A fotografia da direita foi publicada no Jornal O Itaborahyense, nº2124, ano 73, 10 de janeiro de 1968.
[6] Para preservar os depoentes, utilizamos pseudônimos. Entrevista concedida ao autor pelo ex-interno Daniel em 9 de dezembro de 2013 e Jonas em 10 de janeiro de 2014 e Jornal O Itaborahyense, nº2397, ano 85, 27 de abril de 1977.
[7] Quando ainda não existia o tratamento poliquimioterápico (PQT), era comum em alguns casos(principalmente aqueles que não tinham resposta ao tratamento com as sulfas) a mutilação das extremidades do corpo do doente, principalmente dos membros inferiores, comprometendo assim a locomoção.
[8] Para saber mais sobre a primeira Capela da Colônia Tavares de Macedo: https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=353940428111409&id=351048125067306&substory_index=0
[9] Segundo o depoimento da ex-funcionária Martha, da Colônia Tavares de Macedo, frei Vicente caminhava com certa dificuldade e talvez isso possa ter sido um dos motivos de seu acidente. Jornal O Fluminense de 22 de abril de 1977 e Jornal O Itaborahyense, nº2397, ano 85, 27 de abril de 1977.

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Luiz Maurício de Abreu Arruda é Professor de História na rede municipal de Rio Bonito e Mestre em História Política (UERJ). Autor da obra "A nova Jericó Maldita”:Um estudo sobre a Colônia do Iguá em Itaboraí/RJ (1935-1953). Disponível em: http://historiadeitaborai.blogspot.com.br/sear…/label/Textos