terça-feira, 15 de setembro de 2015

Maria Inocência Ferreira: uma trajetória pela Educação em Itaboraí

* Luiz Maurício de Abreu Arruda

Fonte: Acervo Heitor Costa*

      Ao passarmos por um dos Colégios Estaduais mais antigos de Itaboraí, situado em Porto das Caixas, algo nos despertou a seguinte reflexão: Porque este colégio se chama Maria Inocência Ferreira? Afinal, qual teria sido a sua contribuição para o município? Foram esses questionamentos que nos levaram a buscar as pegadas dessa ilustre "desconhecida".
      Maria Inocência Ferreira é natural do município de Friburgo, porém, foi em Itaboraí que construiu sua trajetória, realizando sua principal vocação: Educar [1]. Aqui, fundou aquela que seria uma das primeiras instituições escolares privadas do município. Na fotografia em anexo(direita) podemos identificar o sobrado de belos traços arquitetônicos [2], localizada na Rua São João, em frente à CEDAE, mais precisamente em um dos lotes onde hoje está situado o Esporte Clube Comercial, atrás da Igreja Matriz de São João Batista na Praça de Itaboraí. Já na fotografia(esquerda), trata-se de nossa personagem quando foi homenageada em outubro de 1954 pela Secretaria municipal de Educação e Cultura [3].
      Segundo o relato de uma de suas ex-alunas, a senhora Guiomar Silveira Drumond Costa:

“(...) o colégio funcionava em um belo sobrado onde hoje é o Clube comercial. Era dona Maria inocência e sua sobrinha Amália Teixeira que ministravam as aulas e cuidavam de tudo. Tínhamos aula de Português, Ciências, Geografia, Matemática, Francês, Latim. Tínhamos também aulas de bordado e costura [4].”

      Além das disciplinas mencionadas, a depoente ainda menciona que a escola recebia meninos e meninas, e que “muitas aulas de religião eram ministradas, onde todos deveriam se confessar todos os dias.” Segundo ainda o relato, a professora, que era católica fervorosa, não abria mão dos princípios religiosos na educação, ainda que mantivesse o carinho para com seus alunos, algo peculiar a sua personalidade [5].
      Apesar de sua importante contribuição, Maria Inocência não foi à pioneira no que se refere à educação privada no município, pois contemporâneas a ela, também atuavam outras educadoras no município [6].
      Cerca de um mês após completar 85 anos, em 22 de novembro de 1954, ocorreu o passamento da educadora, provocando considerável comoção na cidade. Em seu funeral, conduzido por seu sobrinho, Monsenhor José Teixeira, pároco de Nova Friburgo e pelo Padre Hugo Montedônio Rego de Itaboraí, estiveram presentes as principais personalidades políticas da região deste período. Mesmo aqueles que rivalizavam no campo político partidário, estiveram presentes no cortejo fúnebre, pois reconheciam a contribuição de alguém que se dedicou exclusivamente à nobre tarefa de educar alguns dos filhos dessa terra [7].
      Poucos dias após seu falecimento, o Jornal O Itaborahyense, em parceria com a Secretaria municipal de educação e cultura, enviou para o Governo do Estado do RJ um pedido formal que pudesse homenagear a educadora, obtendo a seguinte resolução:
“Considerando que a professora Maria Inocência Ferreira prestou, durante longos anos relevantes serviços no magistério primário, decreto: Fica denominada Escola PROFESSORA MARIA INOCÊNCIA FERREIRA, a Escola PORTO DAS CAIXAS, no município de Itaboraí. Palácio do Governo, 19 de Janeiro de 1954. Gov. Ernani do Amaral” [8].

Fontes e Bibliografia:
*Agradeço ao graduando em História, Geovane Pires e a ex-diretora do Colégio Estadual Maria Inocência Ferreira, Sandra Maria da Silva Oliveira pela contribuição na pesquisa.

[1] Ainda que não contemple o conceito em sua totalidade, definimos que: educar é a ação de promover a educação, que compreende todos os processos, institucionalizados ou não, que visam transmitir determinados conhecimentos e padrões de comportamento a fim de garantir a continuidade da cultura de uma sociedade.
[2] Fotografia tirada em 1960. Acervo Heitor Costa.
Jornal O Itaborahyense, nº1810, ano 61, 18 de setembro de 1955.
[3] Jornal O Itaborahyense, nº1810, ano 61, 18 de setembro de 1955.
[4] Entrevista concedida ao autor pela ex-aluna Guiomar Silveira Drumond Costa em 03 de setembro de 2015.
[5] Idem.
[6] Paulina Rosa da Cunha Porto e Cecília Augusta dos Santos são referências nesse sentido.
[7] Jornal O Itaborahyense, nº1799, ano 60, 8 de dezembro de 1954.
[8] Decreto Executivo nº4634 de 19 de janeiro de 1954. In: Jornal Diario Carioca, nº7868, ano 26, 27 de fevereiro de 1954 e Jornal O Itaborahyense, nº1766, ano 60, 07 de fevereiro de 1954.


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Luiz Maurício de Abreu Arruda é Professor de História na rede municipal de Rio Bonito e Mestre em História Política (UERJ). Autor da obra "A nova Jericó Maldita”. Um estudo sobre a Colônia do Iguá em Itaboraí/RJ (1935-1953). Disponível em: http://historiadeitaborai.blogspot.com.br/…/a-nova-jerico-m…
 

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Da Glória ao azar: uma capela e um político exilado

* Deivid Antunes da Silva

Fonte: Deivid Antunes da Silva (2015)

     O tema em questão é sugestivo e visa analisar um determinado espaço geográfico de Itaboraí que teve seu propósito alterado pela evolução do espaço-tempo e as relações políticas de um de seus proprietários de renome nacional. O foco deste texto é a capela de N. Srª da Glória do Engenho do Sumidouro e o Joaquim Gonçalves Ledo.
     À margem do COMPERJ, à esquerda da estrada para o acesso a Portaria Sul fica a Fazenda Sumidouro. Importante histórica e arqueologicamente, contudo renegada ao esquecimento pela memória coletiva local. A partir de análises de fontes documentais, cartográficas e do georreferenciamento, realizado junto com o pesquisador João Antônio Duarte da Graça Vieira, foi possível identificar que as ruínas localizadas na Fazenda Sumidouro são da capela de Nossa Senhora da Glória.
      Fundada, em 1746, pelo capitão-mor da vila de Santo Antônio de Sá [1], Francisco Antunes Leão [2], a capela de N. Sr.ª da Glória, entre a segunda metade do século XVIII e a primeira metade do século XX, funcionou como templo Católico de culto particular, numa relação de interesses que foi praticada no período Colonial e Imperial brasileiro, como analisou Gilberto Freire:“...a capela de engenho. Clero subserviente ao privatismo dos senhores, religião circunscrita à esfera das famílias poderosas...”[3].
      Porém, em data desconhecida por carência de fontes, a capela da Glória do Sumidouro ficou em ruínas, juntamente com a casa-grande e engenho e demais construções do complexo arquitetônico que lá existiu, carecendo atualmente de um profundo trabalho de prospecção e salvaguarda de material arqueológico.
      O complexo do Sumidouro em Itaboraí evoluiu do Sagrado para o âmbito científico, pois o local propicia um trabalho metódico de análise dos artefatos arqueológicos para a construção de conhecimento sobre os agentes sociais no tempo e no espaço daquele local.
Outro ponto que chama a atenção nas ruínas de Sumidouro no distrito de Sambaetiba é o que não está explícito nos afloramentos arqueológicos, mas sim na documentação localizada nos arquivos públicos. Me refiro à história de um de seus proprietários durante o século XIX. Seu nome era Joaquim Gonçalves Ledo [4]. Importante político [5] que, junto com José Mariano de Azevedo Coutinho [6]e José Bonifácio de Andrada de Silva, entre outros, articulou o dia do Fico e a Independência do Brasil em 1822.
     Após sua efervescente atuação política na Independência do Brasil e nos Governos Imperial e provincial do Rio de Janeiro, retirou-se pelas contrariedades da vida pública e da maçonaria, sobretudo por não entrar para a lista tríplice do Rio de Janeiro para o Senado Imperial, vindo a se “exilar” voluntariamente em seu Engenho do Sumidouro, falecendo no dia 11 de maio de 1847 de ataque cardíaco. Curiosamente a 6 de maio no mesmo ano, cinco dias antes de seu falecimento escreveu uma carta ao seu sobrinho informando que havia incinerado toda a documentação gerada por ele sobre a história da Independência do Brasil [7].
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* Deivid Antunes da Silva é Historiador e Professor de História na Rede Estadual de Tanguá.
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Fontes e Bibliografia:

[1] Requerimento de 14 de dezembro de 1756, do capitão de Ordenanças, Joaquim de Souza Rodrigues, ao rei [D. José], solicitando a patente de capitão-mor da vila de Santo Antônio de Sá do Rio de Janeiro que vagou por falecimento do capitão-mor Francisco Antunes Leão. Arquivo Histórico Ultramarino – Rio de Janeiro - Cx. 50, doc. 108.
[2] ARAÚJO, José de Souza Pizarro e – O Rio de Janeiro nas visitas pastorais de Monsenhor Pizarro: Inventário de arte sacra fluminense – Vol. 2 - Concepção e coordenação Marcus Antônio Monteiro Nogueira – 1ª Edição- Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. p.147.
[3] Citado por Ronaldo Vainfas em Trópicos dos pecados: moral, sexualidade e inquisição no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Campus, 1989 p. 16.
[4] Registro Paroquial de Terras da vila de Santo Antônio de Sá – nº 62, fl. 15 - Livro nº 77, 1854-1857 – Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro – Rio de Janeiro – Brasil. Disponível em: http://www.docvirt.com/ docreader.net/docreader.aspx?bib=REG_TERRA3&pasta&pesq.
[5] Joaquim Gonçalves Ledo nasceu na Cidade do Rio de Janeiro em 11 de agosto de 1781, filho de Antônio Gonçalves Ledo e Antônia Maria dos Reis Ledo, foi aos 14 anos para Universidade de Coimbra cursar Direito em Portugal como outros abastados de seu tempo. Ocupou diversos cargos importantes durante o Período Imperial brasileiro. Foi junto José Mariano de Azevedo Coutinho representante da Província do Rio de Janeiro no Conselho de Procuradores Gerais das províncias do Brasil; Deputado Constituinte de 1823; Deputado Geral entre 1826 e 1833; Conselheiro de Estado; maçom da Loja Maçônica Comércio e Artes; Deputado Provincial do Rio de Janeiro na Primeira Legislatura atuando decisivamente na votação da Vila Real da Praia Grande (Niterói) como capital da província em 1835. Vide MACEDO, Joaquim Manuel de – Anno Biographico Brazileiro –Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto Artístico, 1876. & SOARES, Emanuel de Macedo – Atas e documentos da Câmara Municipal de Niterói – vol. 3 –Niterói: Câmara Municipal de Niterói, 1995. p.36.
[6] José Mariano de Azevedo Coutinho era natural de Itaborahy. [7] MACEDO, Joaquim Manuel de – Anno Biographico Brazileiro –Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto Artítico, 1876. Op. cit p.340-341.