quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Da Glória ao azar: uma capela e um político exilado

* Deivid Antunes da Silva

Fonte: Deivid Antunes da Silva (2015)

     O tema em questão é sugestivo e visa analisar um determinado espaço geográfico de Itaboraí que teve seu propósito alterado pela evolução do espaço-tempo e as relações políticas de um de seus proprietários de renome nacional. O foco deste texto é a capela de N. Srª da Glória do Engenho do Sumidouro e o Joaquim Gonçalves Ledo.
     À margem do COMPERJ, à esquerda da estrada para o acesso a Portaria Sul fica a Fazenda Sumidouro. Importante histórica e arqueologicamente, contudo renegada ao esquecimento pela memória coletiva local. A partir de análises de fontes documentais, cartográficas e do georreferenciamento, realizado junto com o pesquisador João Antônio Duarte da Graça Vieira, foi possível identificar que as ruínas localizadas na Fazenda Sumidouro são da capela de Nossa Senhora da Glória.
      Fundada, em 1746, pelo capitão-mor da vila de Santo Antônio de Sá [1], Francisco Antunes Leão [2], a capela de N. Sr.ª da Glória, entre a segunda metade do século XVIII e a primeira metade do século XX, funcionou como templo Católico de culto particular, numa relação de interesses que foi praticada no período Colonial e Imperial brasileiro, como analisou Gilberto Freire:“...a capela de engenho. Clero subserviente ao privatismo dos senhores, religião circunscrita à esfera das famílias poderosas...”[3].
      Porém, em data desconhecida por carência de fontes, a capela da Glória do Sumidouro ficou em ruínas, juntamente com a casa-grande e engenho e demais construções do complexo arquitetônico que lá existiu, carecendo atualmente de um profundo trabalho de prospecção e salvaguarda de material arqueológico.
      O complexo do Sumidouro em Itaboraí evoluiu do Sagrado para o âmbito científico, pois o local propicia um trabalho metódico de análise dos artefatos arqueológicos para a construção de conhecimento sobre os agentes sociais no tempo e no espaço daquele local.
Outro ponto que chama a atenção nas ruínas de Sumidouro no distrito de Sambaetiba é o que não está explícito nos afloramentos arqueológicos, mas sim na documentação localizada nos arquivos públicos. Me refiro à história de um de seus proprietários durante o século XIX. Seu nome era Joaquim Gonçalves Ledo [4]. Importante político [5] que, junto com José Mariano de Azevedo Coutinho [6]e José Bonifácio de Andrada de Silva, entre outros, articulou o dia do Fico e a Independência do Brasil em 1822.
     Após sua efervescente atuação política na Independência do Brasil e nos Governos Imperial e provincial do Rio de Janeiro, retirou-se pelas contrariedades da vida pública e da maçonaria, sobretudo por não entrar para a lista tríplice do Rio de Janeiro para o Senado Imperial, vindo a se “exilar” voluntariamente em seu Engenho do Sumidouro, falecendo no dia 11 de maio de 1847 de ataque cardíaco. Curiosamente a 6 de maio no mesmo ano, cinco dias antes de seu falecimento escreveu uma carta ao seu sobrinho informando que havia incinerado toda a documentação gerada por ele sobre a história da Independência do Brasil [7].
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* Deivid Antunes da Silva é Historiador e Professor de História na Rede Estadual de Tanguá.
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Fontes e Bibliografia:

[1] Requerimento de 14 de dezembro de 1756, do capitão de Ordenanças, Joaquim de Souza Rodrigues, ao rei [D. José], solicitando a patente de capitão-mor da vila de Santo Antônio de Sá do Rio de Janeiro que vagou por falecimento do capitão-mor Francisco Antunes Leão. Arquivo Histórico Ultramarino – Rio de Janeiro - Cx. 50, doc. 108.
[2] ARAÚJO, José de Souza Pizarro e – O Rio de Janeiro nas visitas pastorais de Monsenhor Pizarro: Inventário de arte sacra fluminense – Vol. 2 - Concepção e coordenação Marcus Antônio Monteiro Nogueira – 1ª Edição- Rio de Janeiro: INEPAC, 2008. p.147.
[3] Citado por Ronaldo Vainfas em Trópicos dos pecados: moral, sexualidade e inquisição no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Campus, 1989 p. 16.
[4] Registro Paroquial de Terras da vila de Santo Antônio de Sá – nº 62, fl. 15 - Livro nº 77, 1854-1857 – Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro – Rio de Janeiro – Brasil. Disponível em: http://www.docvirt.com/ docreader.net/docreader.aspx?bib=REG_TERRA3&pasta&pesq.
[5] Joaquim Gonçalves Ledo nasceu na Cidade do Rio de Janeiro em 11 de agosto de 1781, filho de Antônio Gonçalves Ledo e Antônia Maria dos Reis Ledo, foi aos 14 anos para Universidade de Coimbra cursar Direito em Portugal como outros abastados de seu tempo. Ocupou diversos cargos importantes durante o Período Imperial brasileiro. Foi junto José Mariano de Azevedo Coutinho representante da Província do Rio de Janeiro no Conselho de Procuradores Gerais das províncias do Brasil; Deputado Constituinte de 1823; Deputado Geral entre 1826 e 1833; Conselheiro de Estado; maçom da Loja Maçônica Comércio e Artes; Deputado Provincial do Rio de Janeiro na Primeira Legislatura atuando decisivamente na votação da Vila Real da Praia Grande (Niterói) como capital da província em 1835. Vide MACEDO, Joaquim Manuel de – Anno Biographico Brazileiro –Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto Artístico, 1876. & SOARES, Emanuel de Macedo – Atas e documentos da Câmara Municipal de Niterói – vol. 3 –Niterói: Câmara Municipal de Niterói, 1995. p.36.
[6] José Mariano de Azevedo Coutinho era natural de Itaborahy. [7] MACEDO, Joaquim Manuel de – Anno Biographico Brazileiro –Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto Artítico, 1876. Op. cit p.340-341.

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